terça-feira, 24 de agosto de 2010

O oficial de pernas curtas

Começo usando logo um clichêzão: de médico e louco, todo mundo tem um pouco. Lupcínio não era médico. Era louco mesmo. Aos vinte-e-poucos anos, já era capitão da Aeronáutica e frequentava as aulas da PUC vestindo uniforme das forças armadas com divisas e o escambau. Era um militar típico, com barba e cabelos impecáveis, conservador, sério e origem de família extremamente católica. Enfim, era um milico nato.

Lupcínio começou a namorar Zulmira, que também estudava na PUC. O casal parecia ter tudo a ver, pois a família dela também tinha um pezinho no quartel. Em um dos almoços de domingo, a guria levou o seu amado para conhecer a parentada toda, inclusive o avô, Dr. Arquimedes.

- Então você é da Aeronáutica, meu filho? – puxou papo o ancião Dr. Arquimedes.

- Sim, senhor. Com muito orgulho.

- Eu tive uma passagem por lá também, meu filho. Foi coisa pequena, mas inesquecível.

Tal e qual o Vovô Simpson, Dr. Arquimedes desencavou histórias da sua juventude. Lupcínio ouvia tudo com atenção e pontuava os causos com as suas próprias experiências, incluindo a citação a nomes dos seus superiores.

Vovô Arquimedes se recolheu após o papo e deixou o garoto com os papos da família. No dia seguinte, o bicho pegou.

Vovô Arquimedes não era apenas um ex-soldadinho da Aeronáutica. Era um brigadeiro reformado com mais medalhas que o Michael Phelps em três olimpíadas. E os seus contatos com a corporação continuavam firmes e fortes, especialmente no que diz respeito aos nomes dos oficiais de altas patentes. Zeloso pela netinha, ele desconfiou das referências de Lupcínio, gente que nunca ouvira falar. Temendo pela própria memória, ele lançou os nomes citados em todas as bases do Brasil e exterior. Dias depois, descobriu que eram todos inexistentes.

A casa caiu...

Um belo dia, Lupcínio estava na PUC, curtindo a aula de O Homem e o Fenômeno Religioso, quando foi visitado por um advogado da Aeronáutica e um oficial de alta patente. Ambos queriam alguns esclarecimentos sobre a sua farda, suas divisas e a história de ser capitão aos vinte e poucos anos.

Lupcínio caiu em desgraça e quase foi preso. Sumiu da PUC, da vida de Zulmira e dos colegas que me brindaram com esta história. Aliás, não sumiu totalmente.

Epílogo...

Meses depois, uma ex-colega de Lupcínio estava em Niterói, simpática cidade do outro lado da Baía de Guanabara, e passou por uma igreja. Sua atenção foi fisgada por uma presença conhecida no altar. Ela parou, entrou e, boquiaberta, reconheceu o ex-milico-fajuto vestido de padre e rezando a missa.

QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho, somos todos passíveis a uma mentirinha aqui ou ali. Até o He-Man, Master of Universe, por mais que isso não ocorra quase nunca. Mas quando as mentirinhas granham proporções astronômicas, a brincadeira vira aquela doença chamada mitomania, um distúrbio em que o cidadão inventa uma história absurda e passa a viver nela. É fogo, amiguinho! Como a mentira tem pernas curtas, o safado... quero dizer, o mitômano sempre corre o risco de ser apanhado dentro das suas próprias epopeias. Amiguinho, fuja das fofocas com o vampiro foge do alho. Quando tiver algo a dizer, não use intermediários. Até a próxima!!!

2 comentários:

Maria disse...

isso é de verdade, surfista?

Surfista disse...

Pior que é (ou acho que é, né?)! Ouvi de três fontes diferentes, as tais colegas do Lupcínio. Virou uma lenda.

Talvez uma das testemunhas apareça para ler este causo.