sexta-feira, 29 de outubro de 2010

O dia em que um rolo compressor me atropelou

Tão certo quanto tomar um porre na Irlanda é que eu arrumaria um tatame para treinar jiu-jitsu por aqui. Após surfar pela internet, descobri uma academia a poucos quarteirões de casa. Fiz uma visita, gostei e tirei o velho quimono da mala. Na noite seguinte, eu já estava pontualmente em formação e aquecendo junto aos outros alunos.

A turma tinha umas 10 pessoas, entre irlandeses, brasileiros e um cara com possível ascendência árabe. Um dos irlandeses era um gigante. O indivíduo parecia ter uns 120kg distribuídos em 1,90m de altura. Um monstro!

Para você ter uma noção, o apelido da fera era Big Man! Advinha com quem me botaram para fazer o primeiro treino?

- Big Man, pega o Douglas, o novato.

Convenhamos, isso foi totalmente previsível. Sempre que aparecia um "visitante" na minha academia brasileira, o instrutor escolhia um búfalo ou um cara muito técnico para dar as "boas-vindas". Comigo não seria diferente.

Em um primeiro momento, achei que o cara era gordo e alto. Ao tentar botar o touro para baixo percebi que ele era todo sólido, todo blindado.

Caceta, o cara não é obeso. Ele é forte mesmo! E com a cabeça raspada na máquina zero, ele é o próprio Rei do Crime, o inimigo do Demolidor.

Pois bem, o cara era forte, mas não tinha nenhuma técnica. Então, sua arma era esmagar o oponente e isso ele fazia com primazia. Durante longos minutos, fui esmagado, espremido e amassado. A sensação era de estar sob um rolo compressor irlandês. Sobrevivi!

- Douglas! Agora, pega o nosso faixa marrom!

Delícia! Após ser quase pulverizado, eu seria devidamente surrado com técnica. Menos mal!

Como previsto, tomei um sacode digno de quem está parado há meses e resolve bater de frente com um atleta em atividade.

Agora, a parte que torna este relato digno de nota neste blog. Ao fim da aula, fui cumprimentar o gigante irlandês, que era bem simpático. Me apresentei e perguntei o seu nome...

- Bully - ele respondeu.

Como assim??? O cara mais ameaçador da academia se chama Bully! Em português, bully significa "aquele que maltrata", mais ou menos.

QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?
Amiguinho, a lição que você deve aprender e praticar é a da humildade. Seja humilde e reconheça as suas limitações atuais. Não exija do seu corpo a performance de meses atrás, principalmente no que diz respeito ao seu joelho chumbado. Pega leve e vá recuperando a velha forma aos poucos. Amiguinho, não deixe acumular louças, copos e outros utensílios domésticos na sua pia. Até a próxima!!!

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Isso não vai prestar – A história do meu 1º porre na Irlanda

Mais ou menos, às 20h de sábado, saí de casa para uma festinha na casa de um dos amigos irlandeses da minha namorada. Até aí, tudo bem. O que ferrou tudo é que eu tinha tirado a tarde para dormir e fiquei de estômago vazio por horas e horas. Vamos combinar: tudo começou errado.

Aliás, irlandeses são muito sociais. Beber é o seu programa favorito. Beber em casa e com os amigos é o programa ideal.

A casa do Valdomiro, o nosso anfitrião, ficava em um bairro muito agradável. Várias casinhas enfileiradas com cercas de madeira e pequenos jardins à frente. Tudo muito europeu.

A noite estava estrelada e fazia um frio insano. Talvez uns 2 ou 3 graus. Dentro da casa, posso dizer que o clima estava pegando fogo. Na sala de estar do Valdomiro, uma mesa com umas 20 garrafas variadas recepcionava os convidados. Eram muitas garrafas de vinho, alguns Martinis, uma Smirnoff e outras que não identifiquei. Também havia uma grande jarra de Sangria. Na geladeira, algumas Heinekens e Carlbergs. Para beliscar, um tipo de Doritos com chili. Os convidados que iam chegando, também traziam mais bebida.

Isso não vai prestar...

A calefação da casa do Valdomiro deixava o ambiente bem aconchegante. As pessoas também eram simpáticas. Cinco minutos após chegar, eu já estava com uma taça de vinho tinto na mão e conversando com um médico de Bangladesh.

A taça virou duas, que viraram três, que viraram quatro, que viraram uma dose de Martini, que virou um copo de Sangria. Por algum passe de mágica, minha taça nunca estava vazia.

Cadê os Doritos? Isso não vai prestar...

Logo, eu estava ouvindo as aventuras de um irlandês no Carnaval do Rio em 2008. Ouvindo piadas, histórias diversas.

Meu inglês nunca esteve tão bem... quer dizer, eu acho.

Subitamente, os fatos começaram a ficar vagos em minha memória. Vejamos o que lembro e que foi confirmado por testemunhas:

1. Brindei em polonês com uma polonesa.
2. Arrisquei algumas palavras em alemão com uma alemã.
3. Uma espanhola me contou uma porção de coisas (em espanhol).
4. Conversei alguma coisa com um senhor de idade que brotou na festa.
5. Eu dancei na cozinha com uma menina sueca... ou norueguesa... ou finlandesa. Sei lá, uma viking.

Olha, de todo coração, essa é a parte que mais me envergonha. Cara, eu dancei alguma coisa com uma escandinava, teoricamente, um povo tímido.

Percebi que estava ruim, me apeguei ao meu fiapo de consciência e corri para o banheiro. A garota polonesa chegou antes e fez um belo estrago. Mantive a sobriedade e me lembrei do jardim do Valdomiro.

Minutos depois, sentei em um banquinho e botei para fora todo o álcool que estava no meu estômago. Nesta hora, meu anjo da guarda lembrou de mim e minha namorada surgiu sabe-se lá de onde e ficou ao meu lado com um copo d'água.

Isso não vai prestar...

- Much better! Much better! – eu dizia.

- Fala em português, pô.

- No. Don't worry. I'm much better now. Much better.

- Vamos entrar. Tá muito frio aqui.

- No. It's not cold.

Caceta, não estava frio? Devia estar uns 2 graus negativos e ainda ventava. Fazia um frio absurdo e eu estava de camiseta e jeans. Bêbado não sente nada mesmo.

Pelo que lembro, sentei em um sofá e fiquei me concentrando para não ficar com cara de alucinado. Depois, vi alguns flashes: Valdomiro chamando um táxi. A viagem até em casa. Andar até o apartamento. O pijama e a cama. Game over...

Acordei no dia seguinte com uma vergonha lascada. Pelo que soube, ninguém presenciou a minha desgraça no belo jardim irlandês do rapaz. Reencontrei o povo depois e, pelo que soube, cada um tem algo a esconder. Só não encontrei a polonesa que estava na mão do palhaço.

QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?
Amiguinho, não creio que você ainda se presta a esses vexames. Mais de 30 anos na testa e ainda se comporta como um calouro. Vou te contar, hein? Nem com a minha gloriosa ajuda, você se emenda. Repita comigo: se vai encher o pote, encha o bucho antes. Forre o estômago e beba muita água durante a bebedeira. Amiguinho, tenha sempre moedas para facilitar o troco. Até a próxima!!!

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O dilema de Jacira

Eu mudei de continente, mas os casos inusitados não mudam. Antes de completar 10 dias na Irlanda, conheci a pitoresca história de Jacira, uma canadense que veio trabalhar e fazer mestrado na Europa. Lá do outro lado do oceano, Agenor, seu namorado, ficou esperando enquanto a sua pequerrucha corria este mundão de meu Deus.

Vez ou outra, Agenor e Jacira se encontravam para matar as saudades, mas os intervalos entre os encontros aumentaram e uma carência bateu forte no peito da nossa heroína. Em uma de suas viagens de trabalho, a doce canadense foi parar no Paquistão.

Caro leitor, você sabe onde fica o Paquistão? Você consegue me dizer qual a capital do Paquistão? Aliás, você saberia me dizer o que existe no Paquistão, além dos queridos paquistaneses??? Como o Surfista Platinado também é cultura, eis um link para você saber mais sobre esse longínquo país: clica aqui, ó!

Sim, Jacira viajava muito e em sua estadia paquistanesa conheceu um norueguês chamado Humberto. O escandinavo trabalhava com ela e sentiu uma brecha em seu coraçãozinho solitário. Como quem não queria nada, o moço foi se chegando, foi se chegando... e catapimba!, pegou!

O casinho foi crescendo e o carinho recíproco idem. Depois de um tempo, Jacira não conseguia mais se ver sem Humberto, mas também vivia um dilema por causa do seu distante Agenor. A moça não sabia o que fazer ou como fazer. Ela gostava de ambos e não era capaz de escolher apenas um. Certo dia, abriu o seu coração para o viking norueguês.

- Deixa comigo, eu vou conversar com ele – decidiu Humberto.

- Como assim? Você é louco? – apavorou-se Jacira.

- Somos adultos e a única forma de lidar com a situação é essa.

Dito e feito! Em uma bela tarde paquistanesa, Jacira fez um DDI para o Canadá.

- Amorzinho, preciso te contar uma coisa. Aliás, tem alguém que quer falar com você. Peraí um segundinho.

- Agenor, como vai? Meu nome é Humberto e tenho algo para te contar.

E Humberto contou tudo, tim-tim por tim-tim. Agenor, incrédulo, ouvia tudo do outro lado da linha.

- Então, é isso. O que você acha? – encerrou o norueguês.

- Tudo bem por mim.

- Hein? Como assim? Você entendeu tudo o que te contei?

- Entendi.

- Sério?

- Sério.

- Então ela pode ficar com ambos?

- Pode.

Daquele dia em diante, Jacira se tornou uma mulher muito mais feliz e em paz com a sua consciência. E sempre que alguém pergunta sobre como está o seu namorado, ela responde com a maior naturalidade do mundo:

- Qual deles?

QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinhos, especialmente amiguinhas, não pensem que esta historinha bizarra pode se repetir mais de uma vez. Não é todo sujeito que aceita tal relacionamento com esta tranquilidade de monge tibetano. Nosso querido Agenor pode bem estar com a ficha suja na praça e suspirou aliviado ao saber que ele e Jacira estavam quites. Por outro lado, ele também pode ser um exemplar único de macho que aceita um ménage à trois afetivo. A querida Jacira é que se deu bem na história. Agora, ela ganha dois presentes no Dia dos Namorados. Amiguinho, não misture roupas escuras e claras na máquina de lavar, pois as claras serão manchadas. Até a próxima!!!

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Sete dias, dez observações

1. Meu maior medo é ser atropelado em Dublin. Passei a vida inteira olhando para a esquerda antes de atravessar a rua. Na Irlanda, os carros vêm da direita, da esquerda, da frente, de trás, dos céus. Eles brotam do chão...

2. Outro dia, rolou Irlanda x Rússia pelas classificatórias da Euro 2012. Parecia o Brasil em época de Copa do Mundo. Todo mundo vestindo verde pelas ruas e se amontoando nos pubs. Alguns russos também transitavam pela cidade com suas cores e bandeiras. Os irlandeses tomaram uma chinelada de 3x2, mas os torcedores saíram para beber assim mesmo.

3. Em Dublin, também existem mendigos. Muitos parecem vindos do leste europeu. Dá uma pena dos homeless passando um frio lascado e pedindo moedinhas em copos do Starbucks.

4. Todos os carros que vi no "Need for Speed 2 - Underground" estão nas ruas de Dublin. Mercedes e Audi são carros populares. Mas, postos de gasolina são raros...

5. Na Penney's, o casaco que você pagaria 500 reais no Barrashopping sai por 20 ou 30 euros. Aliás, é engraçado perceber que a maior rede de loja de departamentos da Irlanda se pronuncia "pênis".

6. Na minha primeira noite de sexta-feira em Dublin, passei por um pub com rock dos anos 80, um pub com música irlandesa, uma rua que lembrava o Baixo Gávea e uma boate gigante. Bebi uma pint ("páinte") em todos os estabelecimentos. Gasto total: 20 euros.

7. Alguns amigos perguntam sobre o nível da mulherada local. Estou em ótima companhia, mas adianto que aqui transitam espanholas, americanas, suecas, portuguesas, brasileiras (gaúchas) e até irlandesas, dentre outras. Tem mulher para todos os gostos.

8. Os ônibus de Dublin não dão troco. Ou você cata as moedinhas certas ou pega um "vale-refund" para cobrar da empresa.

9. Caminhando pela cidade, a impressão que tenho é que 80% da população é irlandesa e os outros 20% são de todos os lugares do planeta. Aqui tem ciganas da Bulgária, sikhs com turbantes, mulheres com véus muçulmanos, indianos e eu.

10. Conheci um irlandês gente boníssima (uma redundância, a propósito) que, ao descobrir que eu sou brasileiro, celebrou: "Brezil? Yeah! Keptáo Nassi-mên-thou! Amazing!". Cara, Capitão Nascimento é celebridade em Dublin!

Teaser: mal cheguei na cidade e encontrei uma figuraça que tem uma aventura no melhor estilo Surfista Platinado. Publico na quarta-feira.

QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho, que semana agitada. Imagino a saudade que você está sentindo dos engarrafamentos da Lagoa-Barra. Mas, lembre-se das pessoas que estão lá no hemisfério sul e que também sentem saudades de você. No mais, até entendo essa bebedeira dos irlandeses: um copo de água custa o preço de um copão de Guinness. Adivinha o que eles vão escolher? Continue se divertindo. Amiguinho, evite acumular louças na pia. Até a próxima!!!

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

A Ilha Esmeralda


A primeira visão que tive da Irlanda foi da costa rochosa, que em nada parece com as nossas praias brasileiras. Logo depois, vi casas em arquitetura europeia, um cemitério com lápides reluzindo ao sol forte, longas rodovias e, antes de chegar ao aeroporto, as imensas planícies verdes. Antes de pousar, percebi porque o país também é chamado de Emerald Island (Ilha da Esmeralda).

Contrariando tudo que ouvi, o dia estava ensolarado. Fazia até um calorzinho discreto, que era logo afugentado pelo vento gelado. Isso correspondeu às histórias que me passaram. O sol era muito diferente.

Como o sol pode ser diferente, ora bolas?

O sol é forte, luminoso, explosivo. O pôr do sol que vi era de uma brancura imensa, como a cegueira descrita pelo Zé Saramago. E como tudo é plano, o sol preguiçosamente demora a sumir no horizonte. Antes da noite, passei por um pub tradicional, que esqueci o nome. Às 17h de uma terça-feira, os bares já estavam razoavelmente cheios e o povo enchia o pote como se fosse sábado. Tomei a minha primeira Guinness e foi a melhor cerveja que tomei na vida.

Senti que Dublin seria muito especial.

PS. Texto fora do meu estilo de escrever. É uma inspiração safada nas descrições do escritor irlandês James Joyce, autor de "Dublinenses".

QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho, chegou direitinho? Que beleza. A moral é: pega leve com as Guinness e boa sorte! He-Man está econômico hoje e sua sabedoria é muito objetiva. Amiguinho, cuidado ao cortar as unhas. Você pode arrancar um bife do seu dedo. Se precisar, peça ajuda a um adulto. Até a próxima!!!

domingo, 3 de outubro de 2010

Rota irlandesa

No sábado, dia 2 de outubro, a ficha de que vou embora caiu. Arrumei as malas, reuni os amigos e derrotamos uma garrafa de whisky. Não sei se foi influência do Johnnie Walker, mas chorei pela primeira vez. Foi súbito e involuntário. De repente, as lágrimas rolaram. Sabe aquele choro pesado, que encharca o rosto? Pois é, foi assim.

Acordei com uma ressaca monstra e uma dor de cabeça colossal. Almocei com os meus pais e passei a tarde com uma sensação estranha, diferente. Não é medo, mas assusta. Não é tristeza, mas é dolorida. É esquisito, difícil de descrever e não vou tentar botar em palavras o que sinto. A única sensação descritível é uma pré-saudade.

Além das pessoas (óbvio), já sinto a falta de das pequenas coisas: a estatueta do Indiana Jones, o quadro do Muhammad Ali nocauteando o Sonny Liston, o aparelho de sushi, os amados CDs, as camisas de futebol e a varanda com vista para lugar nenhum. Quando eu entrar no avião, tudo será apenas lembrança, como um filme de ontem.

O Surfista Platinado vai atravessar uma porta sem saber o que está do outro lado. É como o final de “Truman Show”, quando o Jim Carrey repete o seu bordão, sorri, passa por uma porta e desaparece.

This is it, como profetizou Michael Jackson.

QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho, vamos parando de fazer beicinho. Até parece que você está se mudando para o Afeganistão. Eu, hein? Vai ser a experiência de uma vida. Vai fundo! Eu, o sábio e todo bom He-Man, estarei contigo. Quer companhia melhor? Amiguinho, o sono rende mais em quartos silenciosos e escuros. Até a próxima! Até Dublin!