quarta-feira, 28 de maio de 2008

A última do papagaio

Certos dias eu acordava de mal comigo mesmo. Olhava para o cara no espelho e não sentia a menor compaixão.

- Trouxa.

Escovava os dentes e torcia para fazer as pazes logo.

- Mané.

Pô, como eu posso ficar me avacalhando assim?

Sei lá. Acho que acontece com todo mundo, pelo menos uma vez na vida. As pessoas normais, saudáveis e mentalmente equilibradas periodicamente se sentem um lixo (como bem descreveu a Ruiva Infinita em um dos seus inspirados textos). Enfim, nessas horas minha auto-estima seguia direto para a sarjeta.

Só que, sem querer, descobri um antídoto: a vizinha do prédio ao lado. Ah, tenho certeza que você já está imaginando a Juliana Paes vindo me pedir uma xícara de açúcar vestindo um baby-doll rosa transparente.

Quem dera...

Minha vizinha do prédio ao lado é uma senhora que nunca vi. Só ouço sua voz e deduzo sua idade avançada. O elemento que ela tem para levantar a moral é um papagaio galanteador. Em um desses dias de briga aberta comigo mesmo, eu desci e passei pelo edifício da tal moça.

Fiuuuu-fiuuuu!

Hein? Como assim?


Alguém fez "fiu-fiu" para a minha pessoa. Olhei para as varandas e não encontrei um sinal de movimento.

Fiuuuu-fiuuuu!

De novo. E não tinha ninguém na calçada. Era para mim mesmo.

Quem seria?

Procurei pelas varandas e não tinha viv'alma. Olhando atentamente, reparei uma gaiola imensa com o louro empoleirado no segundo andar.

E tome fiuuuu-fiuuuu!

Enquanto tanta gente ensina seus papagaios a falar palavrões ou cantar hinos de times, a minha misteriosa vizinha adestrou seu bicho como o maior levantador de moral do quarteirão.

Tornou-se terapêutico. Se estou me sentindo como o cocô do cavalo do bandido da novela mexicana de 1972, já sei o que fazer. Dou uma olhada e vejo se o bicho está de sentinela. Se tudo der certo, não tem mistério. Basta dar uma passadinha pela calçada e...

Fiuuuu-fiuuuu!

Tchau, moral baixa.

Recomendo a todos presentear seus vizinhos com um papagaio inteligente e treinado para galantear os transeuntes.


QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho, para que o papagaio sapeca da vizinha seja o principal elemento para alçar sua moral é que a coisa está feia. Mas, acho que pode ser adequado ao seu caso. Minhas companheiras de Etérnia dizem que para afugentar os dias de deprê basta passar de shortinho em frente a uma construção ou ir ao shopping experimentar roupas. Em questão de minutos elas se tornam gostosas e as vendedoras são só elogios. Acho que nem um nem outro funcionaria no seu caso. Fica com o papagaio mesmo. Amiguinho, saiba pedir desculpas quando estiver errado. A humildade é um sinal de caráter.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

O dilema de Eduardo e Mônica

Não sei ao certo se é um defeito, mas sou suscetível a certos comentários perdidos. Aqueles despretensiosos, sabe? Seja lá quais forem, certas colocações me deixam matutanto, ruminando, buscando explicações, analisando... sei lá. Em uma época em que amigos próximos estão casando e procriando (não exatamente nessa mesma ordem ou com uma ação subordinada a outra), a opinião de um sujeito casado há muito tempo me deixou grilado...

"Não casei com a mulher que mais amei. Casei com a que me dava melhor".

Cara, muitos conceitos meus ruíram como se fossem castelinhos de areia na praia de Copacabana em dia de arrastão. Fiquei atônito porque é uma perspectiva dark para a união máxima. Algo que contraria meu lado "bom garoto romântico" e bate de frente com os ideais enaltecidos em filmes da Drew Barrymore, Julia Roberts e Sandra Bullock - não que eu seja um fã assíduo desse trio, mas serve como parâmetro. A visão é sombria por uma simples razão: faz sentido.

Depois dos 26, 27 anos, por mais subentendido que seja, o homem ou a mulher não se relacionam sem planos a longo prazo. Tirando os peguinhas ocasionais, os casos mais sérios são cercados por uma aura romântica que acaba descambando naturalmente para previsões de amor sem fim. Só que o mais sublime dos sentimentos não vem com adicionais de fábrica e, muitas vezes, o casal tem tantas incompatibilidades que poderia se pegar no tapa, se não fosse o inexplicável afeto.

Isso é comum e você sabe tão bem quanto eu. O par de pombinhos pode ter uma cacetada de divergências. Só alguns exemplos:

ELE: Flamengo
ELA: Vasco

ELE: PT
ELA: PFL

ELE: Cinema europeu em salinhas reservadas
ELA: Cinema pipoca americano no shopping

ELE: Dia
ELA: Noite

ELE: Barzinho com os amigos
ELA: Balada com a galera

ELE: Campo
ELA: Praia

ELE: Rock
ELA: Pagode

ELE: Cético
ELA: Astróloga, ufóloga, taróloga e wicca

ELE: Verão
ELA: Inverno

ELE: Tranqüilão
ELA: Foliã carnavalesca

ELE: Artes marciais
ELA: Ioga pacifista

ELE: Johnnie Walker
ELA: Coca-Cola Zero

ELE: Eduardo
ELA: Mônica

Essa última merece uma legenda. Trata-se de uma citação ao clássico da Legião Urbana sobre as diferenças entre um casal e um final feliz. Muito adequado, pois atropelando as estatísticas e os pessimistas, Eduardo e Mônica teimaram em ficar juntos. É o incompreensível. É Sazon. É o amor.

Mas, sejamos realistas. Muitas vezes não rola e o amor cede aos tantos atritos. Cada um vai para um lado e tanto ele quanto ela acabam se amarrando em pessoas que são complementares em diversos aspectos, mas jamais acendem a chama como aquela outra pessoinha. "Sad but true", como rugiu James Hetfield nos vocais do Metallica.

Acho que esse é o caso do cara que não casou com a mulher que mais amou. Não cheguei a perguntar se isso o tornou mais ou menos feliz. Pelo que vi, ele está bem. Tudo numa boa. Só que nos idos tempos da faculdade, durante as aulas focadas em criação, os professores martelavam um conceito em nossas cabeças:

"O bom é inimigo do ótimo".



QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Meu caro e solteirão amiguinho, você está tendo uma recaída de bom menino com incompreensíveis dores de cotovelo. Tudo bem, seu chapa He-Man está aqui para lhe dar uma moral – literalmente. Bom, já que estamos repletos de citações, tenho uma bem sórdida: "todo parafuso tem a porca que lhe encaixa perfeitamente". Não é uma pérola da poesia, mas pensa nisso. Suas reflexões são pertinentes e fico feliz por isso ter fritado alguns dos seus neurônios. O que posso lhe adiantar é que o legal é ser você mesmo e fazer alguém gostar de você precisamente por isso. Esse é o estopim da chama, da química, do vendaval ou seja lá como você chame a paixão. O que não vale é amar quem não te ama ou insistir em uma pessoa que é extremamente diferente e que não está disposta a ser flexível. A maior lição é que para se ficar ao lado de alguém é preciso abandonar velhos cacoetes e se adaptar também. É preciso ser menos egoísta. Amiguinho, tenha fair-play quando jogar bola com seus coleguinhas. Até a próxima!

terça-feira, 20 de maio de 2008

Face a face com o ídolo


Já diziam os mais antigos: "toda pessoa serve para alguma coisa. Até as ruins, que servem como mau exemplo". Então, nada mais perfeitamente natural do que ter um ídolo. Seja vivo ou morto, político ou anarquista, povão ou erudito, homem ou mulher, o ídolo exerce sobre a massa um encantamento diferenciado. No Brasil, a maioria dessa galerinha que atrai reverências se concentra na classe artística. E nem precisa ser artista. Particularmente, acho muito esquisito o cidadão passar uma temporada em uma casa cheia de câmeras sem fazer absolutamente nada de útil e despontar automaticamente para a fama e o estrelato. Coisas do universo pop que superam a minha esperteza.

Bom, onde quero chegar é que todo mundo tem um ídolo ou já teve alguma vez na vida. Para Adora, amiga morena de corpo escultural e sorriso avassalador, um certo cantor sertanejo despertava sua completa devoção.

- Candinho é fofo. Candinho é talentoso. Candinho é charmoso. Candinho é bacana. Candinho canta muito..

Para mim, Candinho é o raio que o parta! Nunca entendi como esses caras de calças justas e vozes estridentes conseguem mobilizar a paixão de tanta gente, independente de cor, credo, sexo ou nível social. Depois de ficar amigo de um médico goiano que chora quando ouve Bruno e Marrone, passei a considerar esse fenômeno como o tal do imponderável. É aquilo sem qualquer explicação, que existe e pronto.

Mas, voltemos à história de Adora. Muito bem-relacionada, a moça tem passe livre pelos estúdios da Rede Globo e conhece gente graúda da Vênus Prateada. Numa dessas visitas ao Projac, foi avisada que Candinho estava se apresentando no programa da Xuxa.

Adora ficou alucinada. Usou sua influência e foi assistir à gravação do programa de pertinho. Emocionada, cantou junto com o playback do Candinho e se comportou tal e qual uma tiete alucinada. Seu comportamento histérico foi notado pelo artista, que mandou-lhe um beijo. A morena de derreteu.

Depois do programa e do surto de comoção, Adora foi abordada por um rapaz que se dizia da produção do Candinho.

- Senhorita, o artista gostaria de lhe conhecer no camarim.

Adora não é nenhuma adolescente, mas sentiu-se com 15 anos de idade novamente. Acompanhou o rapaz e percebeu as pernas bambearem a cada passo. O coração parecia uma britadeira dentro do peito.

Aí eu pergunto, tem explicação uma coisa dessas? Não, não tem.

Candinho estava sentado em um sofá, com as pernas cruzadas e o sorriso de galã de novela. Bebia uma água mineral e assim que percebeu a chegada de Adora foi cumprimentá-la com um beijo e um looongo abraço.

Eu, que sou amigo, não consigo arrancar um abraço desses, mas o Candinho pode. Ah, entendi. Por essas e outras, acho esse negócio de "amigo de mulher" uma esculhambação.

Candinho a convidou para sentar e ficaram falando triviliades. Adora revelou que é louca por seu trabalho, que tem todos os seus discos e blablablabla. O cantor a ouviu com interesse.

- Adora, você é muito bonita, sabia? - começou. Já estava demorando.

- Obrigado, Candinho - a moça aceitou o elogio numa boa. Sacou o tom do gracejo, mas se fingiu de desentendida.

- Senta aqui, senta - Candinho deu dois tapinhas no colo.

- Como assim, Candinho?

- Aqui, ó. No colinho.

Se eu estivesse naquele camarim, eu diria: "toooooooma. Agora vai sentar"!

- Não, Candinho, você é casado.

- Não se preocupa com isso - e lá foi o ídolo pop encurtando espaços e se aproximando da fã. A cena, segundo descrita, foi digna de uma comédia de segunda. Ele se aproximava e ela se afastava. Ele levantou e ela idem. Pelo canto do olho, ela localizou a porta e preparou uma saída rápida pela direita.

- Você me dá seu celular? - com certeza, Candinho não estava acostumado a ouvir um não. Possivelmente, isso o atiçou ainda mais.

- Não tenho celular.

- Então, me dá o seu telefone de casa.

- Não tenho também.

- Ah, faz isso comigo, não.

- Você é casado, cara.

- E daí?

- Tá pensando que eu sou o quê?

- Linda, só isso.

Adora começou a ficar com medo. O camarim estava vazio e o cara parecia crescer em mãos.

- Candinho, se comporta. Vai que aparece alguém.

E apareceu. Uma apresentadora de TV entrou no recinto. No que ela pisou na salinha, Adora escapuliu sem deixar rastros. Meia-hora depois, voltando para casa, seu telefone tocou.

- Adora, sou eu.

Verdade seja dita, ser uma celebridade abre portas. O mané conseguiu descobrir o telefone da garota em trinta minutos.

- Oi, fala.

- Posso te ver de novo?

- Não, não pode - e desligou.

Adora ainda acha que o Candinho é um bom cantor, mas reviu seus conceitos em diversos aspectos. Visitas a camarins? Só se for acompanhada de um segurança. Se precisar, eu me candidato.


QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinha Adora, você conta com a simpatia do Todo Poderoso He-Man porque tem o nome de minha irmãzinha querida. No entanto, sua ingenuidade merece um puxão de orelhas. Diante de uma mulher bonita, um homem (por ser homem) já é um perigo, agora imagina quando com fama e poder. Aí, somem escrúpulos, pudores, freios e o escambau. O cara vira um caminhão de testosterona desgovernado. Cabe a você, amiguinha pseudo-adolescente desiludida com seu ídolo, ter o discernimento para saber que pode existir um macho tarado por trás da carinha de bom moço. Acho que você aprendeu a lição e não cairá no mesmo truque de novo. Amiguinhos, só tomem medicamentos sob supervisão médica. Até a próxima!

PS. Adora, conte mais histórias sórdidas sobre celebridades. Eu prometo que não revelo suas identidades.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

A aldeia global do Papai Smurf #6

NA TELONA: Como é um fã declarado de quadrinhos, Papai Smurf lembrou que o Homem de Ferro nunca participou da elite dos heróis. Mal comparando, ele, Motoqueiro Fantasma, Luke Cage, Thor e o Namor jogavam a segunda divisão, enquanto Homem-Aranha, Batman, Hulk, Superman e os X-Men disputavam a Liga dos Campeões da Europa. Para mim, Tony Stark nunca foi muito mais que uma versão bigoduda e sem graça do Bruce Wayne. A partir dessa observação pessoal, é espantoso como o Gladiador Dourado ganhou um filme pipoca de primeira linha. Vamos começar pelo elenco que deu o primeiro sinal de credibilidade do filme: Bob Downey Jr.. Jeff Bridges e Gwyneth Paltrow. Mal e mal, todos têm um reputação a zelar e não iriam botar a mão em cumbuca. O destaque é o quizumbeiro Robert Downey Jr., que confere ao personagem um cinismo na medida certa, que não era comum nas revistinhas da Marvel. Os efeitos especiais são ótimos (ohhhh, novidade!), mas são usados para fazer parte da história e não encobri-la. Bom, a história não é o ápice da originalidade, mas demonstra uma certa coragem ao criticar a corrida bélica americana e mostrar gente sendo trucidada no Afeganistão com equipamento ianque. E motivado pela culpa por ser um fornecedor de tanta desgraça, Tony Stark se torna um paladino da justiça. Enfim, nada de outro mundo no roteiro, mas há sempre uma frase de efeito, uma piada oportuna ou um clichê clássico que a gente perdoa. Então é isso, sendo fã ou não de gibis, "Homem de Ferro" é um filme de férias acima da média. Aliás, bem melhor que o desenho animado sem movimento que passava no Xou da Xuxa (era Homem de Ferro, Thor e Capitão América).

NA TELONA: Certo dia, Papai Smurf estava flanando pelo shopping do vilarejo e passou em frente ao cinema. O filme com horário mais próximo era um tal de "Encurralados", estrelado pelo 007 e pelo Rei Leônidas, de "300". Sem ter mais o que fazer da vida, fui ver qual era a da parada. Tratava-se de um suspense sobre um casal sequestrado sem saber a razão. Durante 24 horas, Pierce Brosnan (puxando no sotaque irlandês) os obriga a participar de um tipo de gincana mórbida envolvendo experiências degradantes e psicologicamente devastadoras (isso dentro dos padrões familiares americanos, é claro). Sobre a história de um rapto relâmpago, preferi "Por um Fio", aquele em que o Collin Farrell fica preso em uma cabine telefônica no centro de NY. Enfim, nada de mais, porém os últimos 15 minutos guardam um reviravolta interessante que salva o programa. Quer saber? Espere sair em DVD e vá ver "Homem de Ferro".

NA VITROLA: A banda The Offspring está longe de ser uma unanimidade, mas eu gosto muito. A novidade para os fãs (e detratores) é que um disco de inéditas tem previsão para ser lançado em junho. A bolachinha se chamará "Rise and Fall, Rage and Grace" e foi produzida por Bob Rock (não Bob Rum, esse é funkeiro). Rock ficou mais conhecido depois do documentário "Metallica - Some Kind of Monster", no qual participou e acompanhou os dramas do nascimento do CD "St. Anger".

NO PALCO: Sabadão tem show bom no Rio de Janeiro. Lenine, um dos artistas mais criativos e talentosos da moderna MPB, encerra a turnê do "Acústico MTV" no palco da Fundição Progresso, na Lapa. O ingresso é camarada (a partir de R$25,00) e como já se está na área da boemia, dá para curtir a apresentação e depois emendar em alguma birosca com cerveja barata.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

A ausência do centro-avante na hora do gol - Parte II

Aprendi desde cedo que a palavra de um homem vale ouro e deve ser sempre cumprida. No entanto, não será vergonha se ele passar por uma adversidade fora do seu controle e for obrigado a recuar e adiar suas obrigações. Essa atitude demonstra sensatez e coerência. Mas quem disse que eu fui sensato e coerente?

Ai, ai, ai...

Mesmo com um déficit na arcada dentária, eu confirmei presença em um compromisso com uma assessora-loirinha-gatinha-descolada. Nessa hora, me vieram as sábias palavras de Homer Simpson:

Quando você acha que tudo poderá dar errado, que tudo estará seguindo ladeira abaixo, é porque está mesmo.

Lembrei que meu amigo dentista estava de plantão e liguei imediatamente. A assistente atendeu.

- Oi, Dr. Saulo está atendendo. Quer deixar recado?

Fiquei mega constrangido de contar que o dente havia caído e tentei usar uma metáfora para atenuar.

- Por favor, avisa que o dente do Douglas subiu no telhado.

- Aviso, sim.

Dez longos minutos depois...

- Douglas, o que houve? Que papo é esse que você jogou o dente no telhado? – Saulo urrou desesperado ao telefone.

- Quem disse que eu joguei o dente no telhado? Que história é essa?

- A Neide, minha assistente.

- Não, não... eu disse que o dente subiu no telhado. Ele caiu, morreu, já era. Entendeu?

- E porque você não disse isso? Você acha que a Neide iria sacar o trocadilho, animal?

- Foi mal, fiquei envergonhado com meu estado banguela de ser. Bom, o caso é esse. O provisório despencou e tenho um enconto em uma hora. Socorro!

- Dá para adiar?

- Não.

- É gata?

- Muito gata.

- Então vou te ajudar. Olha, vai parecer estranho, mas você precisa confiar. Passa cola superbonder.

- Hein? Superbonder?

- Pois é, superbonder é biocompatível. Vai segurar o dente durante seu compromisso. Só não pode comer nada, nem ela.

Aimeudeus, aimeudeus...

- Deixa comigo. Obrigado.

- Boa sorte!

Lá estava eu diante do espelho com o dente na mão direita e um tubo de superbonder na mão esquerda. Pensei bem e cogitei desmarcar o encontro. Ela entenderia.

Jamais! Já dizia o hino: "verás que um filho teu não foge à luta".

E não fugi. Caprichei na produção e saí de casa com o dente cimentado à base de superbonder, um gosto amargo de cola na boca e um medo lascado de grudar bochecha, lábios, língua e o escambau.

Tudo vai dar certo. Tudo vai dar certo. Fale pouco. Sorria pouco. Faça o gênero caladão-charmoso.

Peguei a moça e fomos ao tal show. Bebi coca-cola de canudinho e me controlei para não falar muito ou rir aberto. Imagina se na hora da gargalhada a tecla do piano desafinasse e voasse? Eu morreria ali mesmo.

- Você está tão calado hoje? Tá tudo bem? – ela percebeu.

- Estou zen. Só isso. No mais, gosto de escutar você falando.

Mas que raio de idiotice foi essa que eu disse?

- Ah, que bom... então blablablablablabla...

Ela veio que nem uma metralhadora. Durante duas horas e meia eu ouvi de tudo. Fiquei com pena dos psiquiatras que ganham a vida ouvindo as pessoas tagarelarem o dia inteiro. De tempos em tempos, eu ia ao banheiro e reforçava o superbonder no dente.

Com os ouvidos doendo, fui deixar a assessora-loira-gatinha-descolada em casa. Paramos o carro e ela ficou me olhando com aquele sorrisão pidão.

- Então é isso – ela disse.

- Então é isso – eu disse.

Silêncio...

Ela estava esperando um beijo. Mas e o meu medo? Vai que na hora do beijo ela engolisse o meu dente – literalmente.

... "verás que um filho teu não foge à luta!"

Beijei a garota sem língua. Parecia o Tarcísio Meira beijando a Glória Menezes em alguma novela de 1977 ou 1978.

Não alonguei muito o meu desespero. Eu já havia me queimado o suficiente. A gente conversou mais um pouco. Ainda rolou um estalinho e tchau. Depois disso, não vi mais a assessora-loira-gatinha-descolada. Acho que ela não curtiu muito beijar que nem a Glória Menezes.

Epílogo...

1. Essa história aconteceu em idos de 2002, mas eu não lembrava desses detalhes todos. O que me resgatou o drama foi o orkut. Semanas atrás, recebi um convite de uma pessoa estranha. Quando fui checar, adivinha quem era: a assessora-loira-gatinha-descolada. Será que ainda dá para virar o jogo? O centro-avante está firme na posição e o time bem mais entrosado.

2. Dr. Saulo casou há poucos dias. Eu encontei Neide, a assistente, na festa. Quando me viu ela perguntou: "lembra do dente no telhado?". Claro, Neide. Como eu poderia esquecer?

3. Não sou o He-Man, mas dou a dica: quebrou o dente? Mete superbonder que resolve. Vai ficar grudando na bochecha, mas você se acostuma.


QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?
Amiguinho desdentado, você precisa de ajuda médica – e não odontológica. Tudo isso por um rabo-de-saia? Vá se tratar logo ou daqui a pouco você estará no time do Michael Douglas, que ficou taradão depois de filmar "Instinto Selvagem". Convenhamos, que até o poderoso He-Man ficaria quicando depois de atuar naquelas cenas com a Sharon Stone. Enfim, sua coragem só não é maior que sua falta de noção, mas serei legal e botarei a culpa nos seus hormônios. Espero que você esteja mais calminho hoje em dia. Pelo sim, pelo não, lembre-se que um chazinho de camomila relaxa, seu demente. Amiguinho, em um almoço ou jantar social, só repita o prato quando perceber que todos já se serviram. Até a próxima!

terça-feira, 6 de maio de 2008

A ausência do centro-avante na hora do gol - Parte I

Há muito tempo atrás, em uma galáxia distante... resolvi criar um blog. Além do óbvio tesão por contar histórias, seria importante que houvesse uma identidade. Para isso, o espaço virtual precisava de um combustível, uma cara, um tempero, sei lá. O título principal remeteria aos quadrinhos, mas as aventuras narradas precisavam de um espírito, algo que norteasse o humor. Pensei em todas situações bizarras que já vi e vivi e plim!, estava definido o conceito: o lado irônico dos perrengues do dia-a-dia. Por que estou contando essa balela biográfica? Porque, a meu ver, a saga que virá a seguir representa a melhor definição da palavra perrengue. Como é um pouco grande, dividi a trama em dois capítulos (gostei dessa parada de criar tensão com o que virá depois).

Tudo começou com um sim.

- Quer sair comigo? - eu perguntei.

- Sim - ela, assessora de imprensa gatinha e descolada, respondeu.

Demorou!

Com tudo encaminhado, escolhemos uma sexta-feira e o local para o encontro.

- Vamos a um bar no Downtown. Um artista da minha gravadora irá cantar lá e vai rolar canja de algumas celebridades - ela definiu o programa. Ótimo, menos uma preocupação.

Topei na hora. Bom lugar, chopp gelado, música, mesa vip... o que eu poderia querer mais?

Na noite de quinta-feira, repeti algo que faço religiosamente há uns bons anos: fui treinar jiu-jitsu. Decidi pegar leve para me poupar. Se tudo corresse bem, o agarramento forte estaria guardado para sexta. Suei, fiz os exercícios, lutei e me preparei para dar no pé.

- Vamos fazer um último treino, Doug? – eu estava tirando o quimono, mas ficaria feio um atleta mais graduado fazer o convite para a porrada e ouvir um não. Amarrei a faixa e voltei.

Quinze segundos depois...

Cataplein!

Só lembro da joelhada na boca e das estrelas. Não senti gosto de sangue, mas algo estava errado. Ou melhor, algo estava faltando.

- Cortei a boca? - perguntei.

- Não, quebrou o dente - alguém me disse com a voz apavorada.

Hein? Whaddahell??? Talquelpariu!!!

Pois é, perdi o centro-avante na véspera da final de campeonato. Como isso foi acontecer?

Ai, ai, ai...

Liguei para um dentista, amigão de infância, e pedi socorro. Ele percebeu o meu drama e abriu uma vaga emergencial na agenda para a manhã seguinte. Agora a situação era digna do Jack Bauer: 24 horas para cumprir a missão e fazer bonito com a assessora-loira-gatinha-descolada.

No consultório, ele fez o tal procedimento e tacou uma prótese temporária antes da implantação do dente definitivo de cerâmica.

- Segura as pontas que a gente finaliza o trabalho na semana que vem.

- Rapaz, não tenho até a semana que vem. Hoje tenho um compromisso inadiável e não posso abortar a missão.

- Sem problema. O dente provisório aguenta, só não me inventa de morder com força ou cortar com os dentes da frente.

Raios! Perdi uma arma importante. Imagina ficar banguela na hora da dentada na mocinha.

O relógio batia quase 19:00 e eu estava tenso com o tal dente provisório na comissão de frente.

Às 19 horas e um minuto, o dente caiu enquanto eu fazia um lanche.

Às 19 horas e dois minutos, enquanto eu chorava que nem um bebê desmamado, o telefone tocou e adivinha quem era?

- Oi, Doug. Tudo certo para hoje? Estou te esperando, hein? Algo me diz que será inesquecível.

Nem me fale. Ai, ai, ai...

.

- Querida, pode confirmar. Eu lhe pego daqui a pouquinho.


To be continued...


QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?
Amiguinho, He-Man está possuído pelo desejo insano de lhe sacanear, mas vai segurar a onda até o próximo capítulo. Veremos o que você nos reserva.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

A aldeia global do Papai Smurf #5

NA TELINHA: Em 1976, Caetano, Gil, Gal e Bethânia já eram Caetano, Gil, Gal e Bethânia. Todos brilhavam como artistas consagrados e resolveram gravar um disco registrando o inédito encontro. Nasceu assim o lendário "Doces Bárbaros". Tal reencontro só se repetiria na Marquês de Sapucaí em idos de 1994 como tema da Mangueira. Bom, a verde-e-rosa se estrepou e nunca mais houve tal reunião. Mas no showbizz, nunca diga nunca. Em 2002, o quarteto combinou uma nova edição do encontro e coube a Gil acolher o projeto "Outros (Doces) Bárbaros" em seu estúdio na Gávea. Como não era bobo nem nada, Andrucha Waddington (na crista da onda por "Eu Tu Eles") assumiu a direção do filme que acompanharia os bastidores, ensaios e conversas dos baianos depois de 26 anos de separação artística. O documentário dispensa ordem cronológica e se concentra nos bate-papos do grupo, mostrando um pouco da intimidade dos ídolos já maduros. Gil é hospitaleiro e sempre bem-humorado, Caetano fala horrores e se diverte com quase tudo, Gal é silenciosa e Bethânia é introspectiva, beira a antipatia. Teria tudo para dar certo, mas ficou no "teria". Nada impressiona, nada se destaca e tudo é asséptico. Ok, ok, para não dizer que o DVD é um desperdício de tempo, os melhores momentos ficam por conta de uma repórter que pergunta sobre o reencontro dos (sic) "Novos Baianos", um debate entre Gil e Caetano sob o que é pop, um esporro em um jornalista abusado (da Folha de São Paulo, se não me engano) e Bethânia toda soltinha tomando uma cerveja no avião. A melhor frase é do então futuro ministro da cultura: "as brigas são o Red Bull do star-system". Sacou, bro? Smurf Joca quer mandar um presente explosivo para o Andrucha por desperdiçar uma boa idéia.


NA VITROLA: Papai Smurf gosta muito da Rita Lee. A mulher foi expulsa da maior banda de rock do Brasil dos anos 70 e deu a volta por cima construindo uma das carreiras mais sólidas da música nacional. Marcada pela pegada roqueira, a ruiva surpreendeu muita gente quando lançou em 1991 o disco "Bossa'n Roll". Bem antes da febre dos acústicos MTV, Rita reúne seus maiores hits em versões mega-simples: só voz e violão - sem batera, sem baixo, sem metais, sem eletricidade, sem firulas. Nada! Só as melodias. Anos depois, Rita caiu no canto da sereia e gravou um unplugged com o selinho da MTV. Smurfette prefere o "Bossa'N Roll" de longe. Ela está certíssima.


NA TELINHA 2: Papai Smurf é réu confesso: odeia comédias românticas. No entanto, curte muito comédias que primam pelo sarcasmo ou ironia refinada. Se por acaso, um filmeco romântico-mela-cueca consegue fazer rir e ainda sacanear o establishment, a mão está dada à palmatória. E, para grata surpresa de todos os Smurfs, "Letra & Música" é uma pedida leve e interessante para o feriado nublado. A história é açucarada e gira em torno de um ex-popstar dos anos 80 (Hugh Grant, com fino humor britânico) e sua chance de voltar ao estrelado compondo para uma musa teen atual. Para isso, o tal cantor recorre à inusitada ajuda de uma escritora amadora e destrambelhada (Drew Barrymore sem surpresas) com a qual (óóóóóóó) ele acaba se relacionando. O legal de "Letra & Música" é a forma direta como avacalha a breguice da época dos Menudos, a superficialidade das cantoras adolescentes e essa onda nostálgica de desenterrar ídolos de outrora. O ponto alto do filme é o clipe de "Pop goes my heart", sucesso da banda do Hugh Grant. É hilário como escracha todos os excessos daquela épóca.