
Pois é, acabou a folia. Chegou a hora de guardar a fantasia (ou abadá, se for o caso). Também é tempo de rezar para que não surjam sapinhos na sua boca. Ah, acabou o carnaval, mas nada impede que as lembranças permaneçam. Sabiamente cantou o Metallica: "the memory remains".
Enfim, para o bem ou para o mal, a lembrança não é como uma bebedeira, que se esvai com um engov antes e outro depois. Leva um tempinho para sumir e é nesse período que as melhores histórias brotam. Especialmente, sobre as presepadas que aconteceram durante os dias de folia. Enquanto a maioria pensa em contar os louros do sucesso, eu prefiro os vexames, as pequenas derrotas e as saias justas. E, cá entre nós, saia justa é comum a todo folião que tenha se aventurado pelos xuês-xuás da vida carnavalesca.
Como assumo minhas estripulias e sou descarado, assino embaixo de cada um desses três casos. Vamos a eles:
O caso da potranca enganadora.Estava eu, lépido e faceiro, no meio do bloco em um desses paraísos praianos da costa brasileira quando fui arrebatado. Eu me deparei com um trio de morenas saracoteando ao som de um samba-enredo qualquer. Duas eram fracas, mas havia uma que chamava a atenção.
A mulher era uma cavala. Seus cabelos negros esvoaçavam e os peitos siliconados saltitavam dentro da blusinha decotada. No mesmo ritmo, as pernas saradas pareciam britadeiras na calçada. A bundinha durinha sacudia no compasso da bateria.
- Essa eu atendo - pensei com meus botões. Eu só precisaria de mais uma Skol gelada para quebrar os bloqueios da timidez.
Viva o carnaval que liberta os acanhados!- Que absurdo, né? - comentou um companheiro de batalha.
- Nem me fale - complementei.
- Toda essa gostosura e é homem.
Glup!- Ai, ai, ai...
Deus, obrigado por colocar ao meu lado um amigo sóbrio para me livrar do King Kong de chegar junto no traveco.O caso do toco de mestre.O que adoro no carnaval é a mistura de regiões e sotaques. Seguindo o mesmo bloco é possível esbarrar em baianas coreógrafas, cariocas dançarinas, paulistas charmosas, gaúchas ouriçadas e mineiras devoradoras de homens. Ah, as mineiras...
Garota Pão-de-queijo estava batendo fotos com as amigas e eu senti a oportunidade batendo a minha porta.
- Deixa que eu bato uma foto de vocês todas.
- Obrigado - ela respondeu.
Hélio Gracie disse que reconhecia seu adversário pelo jeito de andar. Eu identifico a procedência da periguete só pelo polissílabo de agradecimento.

- De nada, mineirinha - fiz lá os raios da fotos das gurias. Apesar do alto teor de Itaipava na corrente sanguínea, acertei todos os enquadramentos. Garota Pão-de-queijo agradeceu novamente e veio reaver a câmera.
- Nã, nã, nã. Tudo nessa vida tem seu preço. Só devolvo se você disser o seu nome.
Ela disse e eu não decorei. E daí? Eu menti o meu mesmo. Ficamos de papo por algum tempo. Uma piada aqui, um gracejo acolá e vamo que vamo.
- Mineirinha, vou te roubar um beijo.
- Melhor não.
- Por que? Me dá uma razão.
- Seu lábio está sangrando. Acho que você cortou com a latinha.
Hein? Como assim? Impossível! Não pode ser. Argh, nãããããããão!- Jura?
- Juro.
Fiquei tão sem-graça que procurei um buraco na areia da praia para me enterrar.
- Olha, foi mal. Dá licença.
Corri para o apoio técnico dos amigos.
- Tô com a boca sangrando? Diz que não. Diz que não.
- Não. Tudo limpo. Por quê?
Descolei um guardanapo e passei pelos lábios. Nem uma gota de sangue. Gargalhei imediatamente.
- Mas que filha de uma égua mais criativa.
O caso do lobo mau.Mulher parada e sozinha nas esquinas carnavalescas é presa certa. Sei-lá-que-nome estava discretamente rebolando ao som da dança do créu. Passei por ela e percebi um olhar que durou meio-segundo. Ora, mais que suficiente para viabilizar o
approach.
Oi pra cá, nomezinho pra lá, vim do Rio acolá e todo esse blábláblá. Sei-lá-que-nome estava dando condições de jogo e eu estava avançando os meus laterais para cruzar a bola na pequena área. Gol de cabeça!
Ela era magra e parecia novinha. À primeira vista, era uma mulher desabrochando. E, veja você, ainda conversava direitinho.
Sou um bobão mesmo. Acho que sou o único folião que ainda repara no papo da presa. Eu deveria estar de olho no biquíni de lacinho.Ela perguntou minha idade. Eu disse e ela riu entre um susto.
- Sou só um pouquinho mais velho que você, Sei-lá-que-nome. Quer uma cerveja?
- Eu não posso beber. Não tenho idade para isso.
Sinal de alerta ligado.- Quantos 17 aninhos você tem?
- Tenho 15.
Ai, ai, ai... sou um maníaco pervertido. Que vergonha de mim!Fiquei sóbrio em um estalo. Por mais gostosinha que ela fosse, tenho valores e escrúpulos (pequenos, mas tenho). Fiquei imaginando minha filhota de 15 primaveras sendo assediada por um quase Gatão da Meia-Idade. Recuei o time e entreguei o jogo.
Ah, só no carnaval mesmo.
QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,HE-MAN?Amiguinho, depois dessas confissões você deve se considerar um afortunado se alguma mulher cair na sua mão de novo. Valha-me Deus! Bom, pelo menos você foi corajoso em compartilhar conosco essas pérolas, mas se a gente se encontrar na rua, finge que não me conhece. Amiguinho, respeite sempre os mais velhos.