domingo, 27 de julho de 2008

Projeto Rocky Balboa

Aos 15 anos, eu tinha porte magro, o jeitão de CDF e usava óculos, o que me condenava a tomar uns petelecos dos meninos maiores a cada recreio. A diferença dos outros nerds é que eu cismava em revidar. Claro que eu apanhava na maioria das vezes, mas evitava levar desaforo na mochila.

Um belo dia, decidi seguir o exemplo de Daniel LaRusso (o magricelo do "Karatê Kid", lembra?) e fazer algum esporte de luta. Karatê não me apeteceu. Eu queria algo polêmico, controverso. Alguma luta que gerasse burburinhos. Não deu outra. Dias depois, eu raspei a cabeça e comecei a fazer jiu-jitsu. Minha mãe quase teve um troço.

- Meu filho virou um marginal.

Maneiro!

Curiosamente, nunca mais arrumei confusão na escola. Nem na faculdade ou pelos anos e anos que se seguiram.

DIA D: MANHÃ DE SÁBADO, 26 DE JULHO DE 2008

O garoto CDF cresceu, mas continuou usando óculos e com ar de nerd, mas já não estava tão magro. O moleque virou homenzinho e, finalmente, estava realizando um sonho: competir em um torneio internacional.

Quando pisei naquele ginásio cheio, com família na arquibancada e amigos no canto, senti uma alegria inexplicável. Como se eu estivesse dizendo para um monte de gente que ninguém deveria me dizer o que eu sou ou não capaz de fazer.

SETE DIAS ANTES DO DIA D

Maldita balança! Faltando uma semana para o campeonato, eu estava acima do peso e seria desclassificado antes de lutar. Ou eu perderia o excedente ou meu sonho iria para as cucuias. Optei pelo primeiro. Minhas refeições passaram a ser mato e carne branca. Isso significou muita fome em meu ser.

- Liga não. Mais de um terço da população passa fome. Você é só mais um - esse era o naipe de conselho que eu ouvi durante esses dias inglórios.

Fora as saladinhas, eu corria, pedalava e treinava.

Sai peso extra! Sai desse corpo atlético que não te pertence. Some!

VÉSPERA DO DIA D

Pisei na balança com um olho aberto e outro fechado.

83,1...

Para competir, eu precisaria estar com 82,6 kg.

Danou-se tudo!

Assim que cheguei (faminto) do trabalho, fui pedalar uma volta e meia no globo terrestre e esturricar mais uma noite na sauna.

Deus, me deixa competir amanhã.

Fui dormir uma das noites mais preocupadas e famintas dos meus trinta anos de vida.

QUINZE DIAS ANTES DO DIA D

- Você ficou maluco? Você perdeu o juízo? Isso é coisa de desocupado. Você vai se machucar feio. Você não é bom o suficiente.

Esses foram as frases mais animadoras que eu ouvi da minha família assim que anunciei que iria competir. As frases pessimistas eu preferi esquecer.

VÉSPERA DO DIA D (DE NOVO)

Saí para almoçar mais uma saladinha cretina. O garçom me trouxe um prato entulhado de cebola. Comi cheio de raiva, mas com foco no peso a menos.

Voltei para o escritório odiando ainda mais as saladas. Fiquei só com os meus pensamentos, até que...

- Hmmm, que cheiro de cebola aqui dentro? Alguém foi à feira?

Estou podre a cebola. Vergonha, vergonha, vergonha...

DIA D: DEZ MINUTOS ANTES DA LUTA

Eu estava com o coração apertado. Se eu não estivesse dentro do peso, todo o sacrifício teria sido em vão. O ginásio estava cheio e o clima parecia de uma Olimpíada. Eu queria muito participar daquilo tudo. Vesti o kimono e fui para a pesagem com a lembrança da noite anterior... 83,1.

Pisei na balança e...

79,4

Ueeeeeeeeeeeeeba!!!!

Entrei no espaço antes do ringue e o juiz me deu uma dura.

- Com essa faixa você não pode competir. Arranja uma decente,

Pó, minha faixa estava comigo há anos. Claro que estava meio desfiada e tal...

Desesperado, fui pedir uma faixa emprestada a outro atleta. Um francês foi gente fina e me emprestou.

Acabou? É ruim, hein?

- Seu kimono não está nas medidas. Troca ou você será desclassificado.

Taquelpariu! Taquelpariu! Taquelpariu!

Saí do tatame já tirando a roupa. Um amigo estava por perto e também iria competir. Trocamos de roupa ali mesmo. Dois marmanjos de cueca em pleno ginásio lotado.

Bom, se eu não for desclassificado por atentado ao pudor, tudo bem!

Enfim, o juiz permitiu que eu lutasse.

- Combate!

Era para valer! Eu estava competindo!

Iupiii!

Caí por cima e com domínio da luta.

Estou em vantagem! Estou em vantagem! Estou por baixo! Estou ferrado! Perdi!

Minha aventura durou três minutos e quinze segundos antes do nocaute. Olhei para minha família na arquibancada, para os amigos no canto. Senti que desapontei muita gente.

- Doug, levanta a cabeça - meu professor gritou. Eu obedeci É por isso que o jiu-jitsu é tão importante na minha vida: para me ensinar a levantar a cabeça e virar o jogo.

DIA D: CINCO HORAS DEPOIS DA LUTA

Acabou? Não. Eu fui inscrito para outra categoria e teria mais uma chave no mesmo dia. Dessa vez, não haveria restrições de peso, então eu poderia comer à vontade antes. Seria mais ou menos como uma roleta russa: eu poderia enfrentar um cara de 180kg ou um de 50kg. Tudo nas mãos do acaso.

Já com um outro kimono e uma faixa emprestada, fui ver qual seria a minha surpresa. Entre muitos gigantes gringos, meu oponente foi um brasileiro do meu tamanho. Menos mal...

O ginásio já não estava lotado. Minha família havia ido embora. Da minha equipe, só ficaram dois. Seja lá como fosse, eu teria poucas testemunhas.

Seis minutos depois, o combate acabou e havia um empate. A decisão seria pela interpretação dos juízes.

Comigo nada é fácil. Caramba!

Eis que o juiz levantou o meu braço. Eu ganhei!

Ganhei! Ganhei! Ganhei! Ganhei!

Como sempre, pouca gente estava lá para me ver. Não tinha família, musas ou amigos. Só eu.

Ganhei! Ganhei! Ganhei! Ganhei!

Logo depois, eu perdi a próxima luta. Estava exausto pelo dia e não fiquei chateado. Eu já havia conseguido o que queria.




QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho, você passou esse tempo sem escrever e já voltou com a corda toda. Achei que essa sua epopéia não teria mais fim. Ufa! Bom, você continua com essa estranha síndrome de Charlie Brown. Não se lamente por vitórias sem testemunhas. Fique triste por não ter vitórias para contar. Acho que essa sua história reflete mais o "conseguir" do que o "vencer". Isso é o principal combustível de cada dia, garoto: superação e perseverança. Que nem já dizia o titio Rocky Balboa. No mais, fico feliz por você ter se divertido e ter voltado a comer normalmente. Acompanhei de perto o seu drama e acho que você não merece que eu te sacaneie dessa vez. Bom, merece sim. Da próxima vez, verifique se há pilhas na sua câmera antes de um momento único na sua vida. Amiguinhos, se dispor a ajudar demonstra que você se importa. Tente sempre ajudar as pessoas. Até a próxima!



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sexta-feira, 25 de julho de 2008

Mea culpa...

A lojinha está sem renovação de estoque, mas não foi esquecida. Mesmo me rasgando de saudade de escrever por aqui, meus últimos dias foram impiedosos e o tempo se tornou um artigo de luxo. Como não quero publicar qualquer "texto-enche-lingüiça", lamento a ausência e me desculpo com minha dúzia de onze leitores - família incluída.

Vencido o turbilhão, terei tempo para contar o que diabos foi o Projeto Rocky Balboa e relatar algumas novas aventuras passadas em garagens de prédios. Também será o momento de escrever sobre o poder de influência das musas. Enfim, idéias não faltam (graças a Deus). O que me trucida é o tempo, ou melhor, a falta dele.

Para o alto e avante!
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quarta-feira, 16 de julho de 2008

Reações inesperadas

Um dos aspectos que torna a mulher um ser complexo é sua total imprevisibilidade. Elas são a esfinge, a localização do El Dorado, as ruínas de Atlântida, o sopro de Deus... sei lá. Há tanto mistérios ao redor da essência feminina, que só há uma saída: apaixonar-se completamente e dedicar uma vida (ou mais de uma, se possível) à divertida missão de contemplação. Então, contemplando aqui, ali e acolá, de vez em quando, a aura enigmática da mulher se manifesta. E, com um pouco de sorte, pode até render pauta para blogs desavergonhados como esse. Saca só essa historinha...

Era para ser um feriado perdido no calendário, mas surgiu a chance de viagem a um sítio isolado no interior do Rio. Recebi um convite e topei. Os dias no cândido recanto na Floresta Atlântica não renderam grandes emoções, mas o retorno foram outros quinhentos. Quis o destino que sobrasse para meus ombros cansados o terrível fardo de dar carona a três mocinhas que moravam nas minhas redondezas.

Enquanto dirigia, fiquei analisando o cenário e ponderando se valia a pena tentar a sorte com uma das três.

Ó, que dilema. Até parece que eu não iria fazer isso...

Papo vem, papo vai... tomei uma das decisões mais óbvias de minha biografia: tentar a sorte com uma delas, a menina de cabelos castanhos que estudava teatro. Feliz da vida, ignorei um detalhe importante no projeto: a menina morava antes das outras duas.

Logística, rapaz, logística...

Nesse momento, apelei. Usei uma desculpa tão esfarrapada, mas tão esfarrapada, que meu inconsciente fez o favor de apagar da memória. Foi algo do tipo:

- Olha, vou deixar elas duas primeiro, aprendo o caminho e depois volto para te deixar. É para não me perder na volta para casa.

Esse foi uma das frases mais absurdas e desprovidas de nexo que eu já disse. Como eu poderia me perder no caminho que faço todo santo dia???

Elas gargalharam. Eu gargalhei. E ficou por isso mesmo.

Eu mesmo me racho a cara de vergonha às vezes.

Deixei as duas empatas em casa e voltei para fazer o approach na gatinha. Estávamos diante do prédio dela, carro parado e música light no ambiente.Tudo no esquema, e, de repente... baixou o Balloubet du Rouet em minha pessoa. Saí do carro, tirei as malas dela, dei dois beijinhos e fui embora sem compreender minha atitude.

Corta para dois meses depois...

Encontrei com a tal estudante de teatro em uma festa qualquer. Já soltinha por uns drinks a mais, ela me chamou no canto.

- Lembra o dia em que voltamos do sítio?

- Lembro.

- Lembra do momento em que você foi me deixar em casa por último?

- Sim, claro.

- Era óbvio que você iria tentar alguma coisa comigo.

- Pois é...

- Enquanto você dirigia, eu pensei em duzentos foras educados para lhe passar.

- É mesmo?

- Mas, você não fez absolutamente nada. Você me passou uma cantada explícita, deixou minhas amigas em casa e... não fez absolutamente nada depois.

Fiquei mudo.

- Nunca fiquei tão indignada, tão revoltada, com um homem como naquela noite. Você tinha a obrigação de chegar em mim.

Eita!

É ou não é impressionante?


QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho, ainda bem que o seu inconsciente deletou a sua brilhante argumentação sobre a melhor forma de deixar três garotas em casa seguindo uma lógica assustadoramente estúpida. Sorte sua, mas o contexto deve ter sido aquele mesmo. Bom, tirando essa sua lição de como manter seus objetivos discretos, acho que o imprevisível foi você. Seguindo uma normalidade, você deveria passar uma conversa mole na guria, e ela deveria lhe dar um toco de cinema. Essa era a lógica. Como você abortou a missão, houve uma ruptura na ordem do universo e os reflexos se manifestaram nos dois. Você voltou para casa de mãos abanando e ela teve que guardar o discurso de "passa amanhã" para outro mané. E, outra coisa, não se preocupe em entender a mulherada. Nem elas se entendem. Amiguinho, em uma mesa, sempre puxe a cadeira para a dama sentar. Até a próxima!

quinta-feira, 10 de julho de 2008

O dia em que virei música sertaneja

Quando completa 20 anos, o homem tem muito a provar. Resumidamente, ele tem que demonstrar responsabilidade, mostrar para as mulheres que dá conta do recado, ter pique para sair durante a semana e ir trabalhar no dia seguinte, estudar nas brechas de tempo e fingir que tudo está na mais plena normalidade. Enfim, o cara tem que mostrar que já saiu da barra da saia da mamãe.

Aos 20 aninhos, eu conheci uma garota de Petrópolis e a gente saiu algumas vezes. Em um belo e formoso dia de inverno, ela me ligou e fez um convite para um programinha a dois na serra. Nesse momento, quase ouvi meus espermatozóides gritando enlouquecidamente:

- Primeiro eu! Primeiro eu! Primeiro eu!

Demorei 0,00000001 segundo para tomar uma decisão cientificamente estruturada.

- Demorou! Te encontro no sábado.

Tudo agendado e eu só precisava do carro para subir a montanha, encontrar a menina e lhe proporcionar uma experiência singular. Algo que a deixaria com um sorriso de orelha a orelha por toda a eternidade. Sim, sim, eu era muito fanfarrão. Mas, voltando ao pequeno detalhe do automóvel, nem esquentei a cabeça. Meu pai entenderia a minha situação e me entregaria a chave do carango com a sensação de dever cumprido. No dia D, fui pedir o meu passaporte para a felicidade.

- Nem que a vaca tussa.

Hein?

Tentei argumentar com toda a seriedade e responsabilidade. Prometi ter todo o cuidado do mundo, não beber, não passar dos 80km/h, praticar a direção defensiva, usar o cinto, respeitar a sinalização, guardar o carro, pagar a gasolina...

- Nem que a vaca tussa.

- Mas, pai, a menina é estupidamente linda! Você não me deixaria passar essa vergonha diante dela, né? - apelei para o instinto de macho do meu velho. Ele já foi garoto um dia.

- Nem que a vaca tussa.

- Quer saber? Não preciso do carro. Vou de ônibus. Lá eu me viro. Se algo me acontecer, a culpa será sua... e blá-blá-blá-blá.

- Vai mesmo?

- Vou.

- Então é melhor correr, pois a rodoviária só tem ônibus para Petrópolis até as 9.

Ai, ai, ai... meu pai é um ogro!

Havia chegado a hora do meu rito de passagem. Eu jamais passaria aquele sábado em casa. Mais do que subir a serra e papar a garotinha, eu estava diante de um desafio moral para minha masculinidade. Troquei de roupa, peguei uma grana e fui à luta.

Da minha casa até a rodoviária, foram quase duas horas de ônibus. De lá para Petrópolis, foi mais uma hora. Do centro da cidade até a boite onde ela poderia estar, foram mais trinta minutos e uma fortuna no táxi. Teria que valer muito esse sacrifício.

Aliás, tudo às escuras, pois até então, eu só tinha um telefone e um local onde ela poderia estar. Eu teria que confirmar maiores detalhes, mas deixei para depois e esqueci.

Só quando pisei fora do táxi fui lembrar de um detalhe: Petrópolis é uma cidade serrana e seu clima não é o mesmo do Rio de Janeiro. Fazia um frio glacial e eu estava vestido com uma reles blusa de linha. E para piorar, ventava pra cacete! Ô cidade de vento gelado. Cada rajada de vento congelava até meus ossos.

Liguei para a menina e nada. Só sinal de ligação incompleta. Tentei mais uma vez. E mais uma . E mais outras vinte. Nada.

Já que estava na frente da boite, resolvi entrar. Conferi as reservas financeiras e vi que teria que botar as próximas despesas no cartão de crédito.

Santo dinheiro de plástico.

Entrei na fila e aguardei a entrada com um frio lazarento. Chegando perto da entrada, fui tomado pelo pânico:

"Não estamos recebendo nenhum cartão de crédito", dizia uma plaquinha.

Danou-se! Danou-se muito!

O cenário não poderia ser mais bacana: a garota sumiu, estava com pouco dinheiro, a boite não aceitava cartão, fazia um frio ártico, não conhecia ninguém e só haveria outro ônibus para o Rio na manhã seguinte. Decidi voltar para o centro da cidade de ônibus e depois de esperar quase três horas consegui uma condução. Exausto, eu ainda precisaria matar o tempo até o primeiro horário da linha Petrópolis-Rio. Não resisti e dormi em um banco de praça, tal e qual cantado por Bruno e Marrone. Só acordei com o dia claro e uma velhinha fazendo cooper. Ela me fuzilou com um olhar de reprovação do tipo "ah, essa juventude bêbada".

Voltei para casa amassado, dolorido, cansado, sem ter comido ninguém e com o orgulho pisoteado. Horas e horas depois, a desgraçada, quer dizer, a menina que motivou minha aventura me telefonou:

- Oi, vi que você me ligou algumas vezes. Eu tive que viajar para Minas e ficou fora de área. Tentei lhe avisar, mas não consegui. Espero que você não tenha subido a serra sem confirmar comigo. Não, acho que você não faria isso.

Eu? Imagina.




QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho impulsivamente descerebrado, sua atitude foi estúpida, mas típica de alguém com 20 anos. Aposto que você cresceu e aprendeu a lição, mas ainda faz esse tipo de presepada. É bem do seu feitio. Agora, anote essa outra dica no seu caderninho do Jáspion: por mais que você queira provar algo (e isso ocorre todo santo dia), tente tomar suas decisões com o máximo de informações possíveis. Conclusões baseadas apenas no emocional atrapalham a execução e a finalização. Amiguinho, cachorros são camaradas, mas tenha sempre cautela ao brincar com um totó desconhecido. Até a próxima!

domingo, 6 de julho de 2008

Mundo bizarro (ou o dia que não fez sentido)

Você lembra do Bizarro? Ele era um dos vilões do desenho dos Superamigos e representava uma versão tosca do Super-Homem. Vindo de uma realidade distorcida, deformada, ele era o inverso de tudo que conhecíamos ou fazia sentido culturalmente. Pois bem, no último dia 2 de julho eu estive no mundo do Bizarro.

Sem compreender bem, eu estava no Maracanã (ele, mais uma vez), porém não era do jeito que sempre estive. Ao contrário de dezenas de outras vezes, eu pisei naquele território sagrado sem vestir vermelho e preto. Pois é, enquanto milhões de tricolores se matavam por um ingresso, eu, flamenguista convicto, estava na torcida pó-de-arroz acompanhando a final da Copa Libertadores da América.

A materialização dessa anomalia foi para deixar meu pai feliz. Nunca fui tãããão sintonizado com ele, pois nossas afinidades nunca foram as mesmas (a começar pelo time de futebol e seguindo por uma cacetada de coisas). Rola um respeito imenso, mas nossas crenças não costumam se encontrar e isso acaba criando uma distância. Mas, fazer o quê, né? Pai é pai e decidi levar o coroa ao Maraca para que ele visse o Fluminense ser campeão. Pelo meu lado, a situação era bem simples: ou eu veria uma histórica vitória tricolor ou acompanharia in loco a desgraça de um rival.

Logo que entrei nas dependências do estádio, veio uma paranóia horrível, um medo cavalar que percorreu toda minha espinha...

E se algum tricolor me reconhece por aqui? Eu posso ser linchado.

Segurei a onda e mantive a calma.

Tudo vai dar certo. Tudo vai dar certo.

Uma vez acomodado nas cadeiras azuis, comecei a relaxar. E a primeira ação foi procurar algo para sacanear os tricolores depois. A observação inicial foi bem positiva: como havia mulheres bonitas ali. Os caras eram todos feios, mas a mulherada era de se tirar o chapéu. Não por acaso, ficamos logo abaixo de uma torcida organizada chamada... "Flu-Mulher". Como seria uma briga na "Flu-Mulher"? Tapas e puxões de cabelo? Seria uma torcida de mães preocupadas com seus pimpolhos no estádio perigoso? Acho que não, pois aí seria "Flu-Mãe", o que não pegaria muito bem.

Coisas do Fluminense e do seu Mundo Bizarro...

Pouco antes do apito inicial, uma abertura espetacular. Tirando o patético pó-de-arroz, a torcida fez uma festa extraordinária com fogos, sinalizadores, bandeiras, coreografias e música. As imagens no telão colaboraram com cenas dos jogadores e mensagens otimistas. Admito sem receio que fiquei impressionado. Meu pai, de queixo caído, quase foi às lágrimas. Ver o cara feliz me deixou feliz. Nessa hora, desisti de secar o Fluminense. Já que estava no Mundo Bizarro, eu faria parte dele.

Bola rolando e em poucos minutos aconteceu o improvável: gol da LDU. Como conseqüência, um silêncio de sepultura tomou conta do público. Foi nesse instante que eu fiz algo ainda mais imprevisível que o próprio gol da LDU.

- Neeeeeeeense! Neeeeeeeense! Neeeeeeeense!

O que eu estou fazendo?

Não sei como pude, mas eu puxei o coro para animar a torcida. Com o estádio inflamado, o tal do Thiago Neves se tornou decisivo e fez um gol. Depois mais um, e depois outro. O Fluminense poderia ser campeão e eu estava vibrando (não muito, mas estava vibrando).

Meu pai estava orgulhoso e cantava comigo todas aquelas músicas chatas dos tricolores. O título poderia vir sem prorrogação e sem penais. Mas não veio nos 90 minutos. E nem na prorrogação. Só restavam os pênaltis.

Aí você já sabe o que aconteceu. O escrete com a camisa de cortina de cantina italiana cobrou as penalidades de forma bisonha e o time equatoriano ficou com o caneco.

Olhei ao meu lado e meu coração se despedaçou. Meu pai, com os olhos de peixe morto, estava sentado e incrédulo. Resmungou algumas palavras sem sentido, xingou o Renato Gaúcho, avacalhou o Washington e logo foi tomado pelo silêncio.

O Mundo Bizarro começou a se desfazer e eu odiei o Fluminense como nunca antes. Nesse instante, eu constatei que eu não torci pelo raio do time das Laranjeiras: eu torci pelo meu pai. Eu fiz aquilo que quero receber de um filho meu um dia. Eu queria ser cúmplice de uma imensa alegria do meu velho pelo menos uma vez. Eu queria que ele soubesse sobre o meu amor e admiração de uma forma não verbalizada. O Fluminense não deixou.


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QUAL A MORA DA HISTÓRIA,
HE-MAN?
Amiguinho, conhecendo você como conheço, posso lhe afirmar duas coisinhas. A primeira é que sua passagem pelo purgatório foi encurtada. A segunda e mais importante é que esse foi um dos gestos mais nobres que você já fez. A lição que espero ter lhe atingido é que a vida sempre nos apresentará inúmeras situações em que não poderemos ser teimosos como burros empacados. Sabe, nossas intransigências podem nos privar de momentos bacanas, como a sua noite no Maracanã torcendo para esse time hediondo. Amiguinho, desligue seus aparelhos elétricos durante tempestades. Até a próxima!


quarta-feira, 2 de julho de 2008

Pânico no shopping

Quer ver um homem tenso? Solte o coitado em um shopping e diz "compra uma roupa legal para uma garota. Não vale nada clássico". Peraí, como assim "legal"? O que é "clássico"? Para mim, legal é um camisa branca básica e um jeans. Clássico idem.

Danou-se!

Tirando os metrossexuais, os homens e a moda vigente são elementos quase incompatíveis. Ou você, leitora, acha que um galalau vai acompanhar o São Paulo Fashion Week para se antenar sobre as últimas tendências da coleção primavera-verão? É ruim, hein!

Aliás, um parêntesis: esse termo metrossexual é digno de nota. Originalmente, foi um adjetivo esquisitão criado para classificar as atitudes pomposas do David Beckham e outros marmanjos mais delicados com seus guarda-roupas. Dizem que não deprecia a macheza do indivíduo, mas ainda estou para ver um sujeito que vista essa camisa e fique tranquilão.

Parêntesis longo esse...

Voltando ao tema, homem dentro de uma loja feminina é um peixe fora d'água em 95% dos casos. Eu, por exemplo, sempre peço ajuda às universitárias. Quando preciso comprar presentes femininos (leia-se roupas), eu convido uma amiga que tenha o perfil da presenteada para um passeio entre vitrines. Como o shopping-center é quase um playground para a mulherada, sempre arrumo um apoio tático imediato. Mas, e quando há urgência e o suporte está indisponível?

Não é garantia absoluta, mas percebi alguns detalhes que são uma mão na roda. O primeiro é observar a loja. Quanto mais vendedoras gatas e clientes tchutchucas, melhor é a loja. Deve ter preço bom e produtos interessantes. Mulher sabe identificar uma liquidação com olhar clínico.

Já dentro do covil, o lance é conquistar a simpatia da vendedora. Não entenda que é para praticar sua técnica de galanteio com a infeliz. É preciso fazer com que a sua atendente sinta vontade de lhe ajudar. Claro que todas são forçadamente amistosas e querem lhe vender o vestido mais caro da loja, mas dá para descolar uma consultoria imediata. Como? Como? Humildade, efeito comparativo e elogios.

- Olha, estou procurando uma roupa para uma amiga, mas sou um desastre para escolher. Preciso de ajuda e acho que você tem bom gosto. Ah, ela é magra assim como você.

Abracadabra!

"Sou um desastre", "você tem bom gosto" e "magra como você". Três colocações mágicas e a vendedora só ficará contra você se não tiver um pingo de amor no coração.

Por mais alheio que você seja ao mundo fashion, é vital que seu bom senso esteja em alerta. Desconfie se a sua nova amiga vendedora quiser lhe empurrar uma blusa laranja-bergamota com bolotas verde-incandescentes. Pode ser a sensação em Milão, mas nada tão berrante sobrevive mais que dois meses. Uma peça dessas está condenada a virar pijama ou doação para a campanha do agasalho.

E tenha discernimento. Ter ficado bem na Ana Hickman não quer dizer que ficará bem na sua presenteada. Ainda mais que até uma camisa promocional com as inscrições "Totonho para Vereador" ficaria bem na Ana Hickman. A parada é não forçar a barra.

Quer saber? Se o bicho pegar, amigo macho desconhecedor do badalado mundo da moda, mude a estratégia e dê um elegante presente de uma sex-shop.


QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?

Amiguinho Surfista, para quem se diz tão avesso ao universo da moda, você esteve bem à vontade nesse tema. "Sensação em Milão", "tendência primavera-verão", cores fora de contexto, metrossexualidade... hmmmmm, David Beckham está perdendo um novo coleguinha no seu clube. Bom, mas cada um com seu cada um. Saca só as palavras imortais de He-Man: moda é cíclica e não muda a vida de ninguém (exceto a da Gisele Bündchen). Vai, volta e vai de novo. Calça com boca de sino foi show de bola, virou brega e depois voltou a povoar as vitrines. Já o bom gosto dura para sempre. Comprar uma roupa é um exercício de sensibilidade e reconhecimento às características da sua amiga. Dependendo do caso, uma blusinha da C&A pode ter um efeito mais positivo que uma comprada numa grife. Amiguinho, tenha disciplina na hora de fazer a sua lição de casa. Nada de TV ligada ou coisinhas que tirem sua atenção. Até a próxima!