segunda-feira, 29 de julho de 2013

Andar com fé

- Você é muito “hobbesiano”.

O chato de discutir com alguém culto é correr o risco de ser chamado de “hobbesiano” em tom de insulto e decepção. Minha namorada oportunamente desencavou Thomas Hobbes, perdido em lembranças das minhas distantes aulas de sociologia. A razão foi simples: assim como o moço pensador, eu não acredito na raça humana.

Nossa, que desesperançoso, hein? Mas é verdade.

Assim como o velho Hobbes, não tenho fé no bicho-homem. Na minha filosofia de botequim, penso que o tubarão, o leão ou qualquer outra fera do mundo animal ataca em busca de alimento ou por defesa. Mesmo dotado da feliz habilidade de pensar, o ser humano ataca por prazer e é capaz de barbaridades contra outro ser humano. Da mais tenra idade ao ocaso da vida, o indivíduo é pleno em seu egoísmo e maldade.

Nossa, que deprê, hein? Mas, peraí. Não vá cortar os pulsos ainda. As coisas vão melhorar – pelo menos, no enfoque desse texto.

Eis que o simpático novo Papa vem ao Brasil, mais especificamente ao Rio. Na sua bagagem sem luxo, ele traz seus utensílios pessoais, a guarda suíça, o Papamóvel e uma pequena multidão. Coisa miúda: umas 2 milhões de pessoas para a Jornada Mundial da Juventude.

Eu, católico batizado e crismado, nunca me liguei em um Papa antes. João Paulo II transmitia tranquilidade. Bento XVI me deixava com a pulga atrás da orelha. Francisco tem algo especial, algo conciliador que fica ainda mais evidente a seguir.

Confesso isso com distanciamento crítico. Eu admiro algumas pessoas, independente dos seus credos. Gosto da mensagem do Dalai Lama, do Chico Xavier do Pastor Martin Luther King e por aí vai. Gosto de figuras que me forcem a questionar a minha descrença com a raça humana.

Logo após a sua chegada, acompanhei o traslado do Francisco entre o aeroporto e o Centro da cidade. Em seu caminho, o Papa caiu em um engarrafamento súbito e seu Fiat Idea foi cercado pela multidão. O religioso continuou com as janelas abertas enquanto cumprimentava as pessoas. A guarda suíça deveria estar em alerta máximo. Eu, de olhos colados na transmissão via internet, estava em pânico.

Jesus, alguém vai dar uma facada no Papa!
 
Contrariando os pessimistas, Francisco não se feriu. Chegou sã e salvo e desfilou pelo Centro. Parou em uma esquina e escolheu uma criança para um rápido carinho. Foi um beijo uma benção express. Seguiu caminho.

Pouco depois, a imprensa localizou aquela criança beijada por Francisco no Rio. Era filha de uma evangélica que acompanhava a passagem do Papa. Caramba, isso é muito significativo. O chefe maior dos católicos beija uma criança evangélica, escolhida aleatoriamente entre milhares de outras. Papai do Céu, lá do seu escritório, sabe dar os seus recados.

Dias depois, vi o Francisco botar o pé na lama e visitar uma favela. Esse argentino é o Papa mais ágil que já vi. Subia escadas com destreza e caminhava com desenvoltura. Estava vendo a hora de Sua Santidade dar um duplo mortal carpado.

Mais uma vez, Francisco não se privou do contato com o povo. Abraçou, beijou e falou com quem bem ele quisesse, independente de classe, cor ou time do coração.

Juro por Deus, me emocionei. Sozinho em casa, eu chorei. Achei tão bacana. Tão humano. Nunca vi um padre fazer essas coisas, o que dirá um Papa.

Desde que me entendo por gente, ouço um ditado: “se quiser conhecer o caráter de uma pessoa, dê-lhe poder”. Hoje, estou feliz porque os velhinhos do Vaticano passaram a batina branca para o bom Chico, o argentino mais gente boa que se tem notícia.

Epílogo.
Fui até Copacabana ver o Papa e aquela multidão que estava lá para ouvir a sua mensagem. Aliás, “ver” é força de expressão. Vi Francisco passar pela Avenida Atlântica em uma fração de segundos. Um vulto branco sorridente. O que me chamou mais a atenção foi o povo. Pessoas de todos os lugares. Bandeiras hasteadas de países que nunca ouvi falar. Várias línguas entoando cânticos. Padres de batina preta esvoaçante cercados por jovens e velhos. Era um clima de réveillon, mas sem Cidra Cerezer e despachos para Yemanjá. Hoje, estou um tiquinho menos “hobbesiano”.  


QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?
Amiguinho, epílogo? Enfim, a lição de hoje é sobre a coexistência. He-Man já ouviu pessoas esclarecidas dizerem que adorariam que houvesse uma única religião no mundo. Porém (tem sempre um porém), que fosse a religião delas. Hmmm, esquisito, não? He-Man, que é todo sabedoria e todo músculos trabalhados na maromba, acha que a palavra chave para tudo é a coexistência. Faça a sua parte e aceite a crença do coleguinha. Amiguinho, gavetas servem para organizar os seus pertences e não paras entulhar tralhas inúteis. Até a próxima!!!

Epílogo do He-man
Chorou, foi? Tadinho. Quer chupeta?



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