terça-feira, 19 de novembro de 2013

Mil e uma noites

Para a compreensão total deste drama (verídico, é claro), é essencial mergulhar nas percepções da protagonista. Sendo assim, escrevo em primeira pessoa. Senhoras e senhores, segue o relato de Clotilde, a advogada.

Era uma vez...

Acordei com a cabeça vibrando no nível 6 da escala Richter. É aquele terremoto que derruba prédios, sacou? Levantei assim mesmo e fui à luta.

Cheguei ao trabalho escondida  atrás de óculos escuros de lentes imensas. Como se as lentes escondessem a minha cara de derrotada. Ao longo da manhã, tramei assassinatos passionais a todos que me perguntavam se a noite tinha sido boa. Se tivesse sido boa, eu não estaria com a cara de colombina em quarta-feira de cinzas.

Lá pelas 11 da manhã, meu telefone tocou. Era o maridão.

- Clotilde.

Era meu nome. Quando o maridão liga e me chama pelo nome direto, sei que alguma coisa está errada. Será que vomitei na cama e deixei azedando ao sol?

- Amooooooor.

Tentei prolongar a palavra “amor” da forma mais fofa do mundo. Tática de amansar a fera pela doçura, entende? Às vezes, funciona.

- Clotilde, você fez alguma compra ontem à noite?

Compra? Euzinha? Calma. Concentra. Que compra? Como assim? No meio da noite? E a festa de ontem? Comprei alguma rifa na festa? Concentra mais. Peraí... aimeudeusdocéu!

- Amor, é possível que sim.

Sabe quando o passado volta à sua mente que nem flashbacks de “Além da Imaginação”. As lembranças vêm em fragmentos desconexos e você vai juntando as peças até a vergonha total estar montada diante de você.

Corta para a noite anterior.

Chegamos da tal festa e o maridão foi direto para a cama. Eu fiquei na sala meditando sobre os efeitos dos espumantes na coordenação motora das pessoas. Liguei a TV. Esse foi o meu erro.

Zapeei pelos canais e só encontrei reprises, filmes, programas eróticos com loiras americanas peitudas, seriados, desenhos animados e outras tralhas. Não sei porque cargas d’água, parei em um canal de compras. Aliás, sei sim. Fui hipnotizada por um par de brincos lindos de morrer. Não consegui tirar os olhos daquelas peças brilhantes. Vislumbrei amigas invejosas cobiçando aqueles brincos em minhas orelhas. Peguei o telefone e liguei para o número que estava na tela.

Corta para o vergonhoso momento em que eu era sabatinada pelo maridão impiedoso.

- O que você comprou, Clotilde?

- Talvez um brinquinho. Coisa pequena.

- Coisa pequena?

- Sim, mínima.

- Custou R$ 8 mil.

Aimeudeus!!!

- Repete.

- R$ 8 mil.

Fiquei sóbria. A ressaca sumiu milagrosamente. Adrenalina pura, querida. Pior que a imagem do brinco voltou nítida à minha mente. Era uma coisa breguíssima, imensa, cafona. Todo errado. Bêbada acha cada coisa bonita.

- Aconteceu algum engano, amor.

- Clotilde, você usou o meu cartão de crédito e eles entraram em contato comigo. Avisaram que já estão despachando o seu pedido. Não são burros. Liga e cancela a compra agora.

- Tenho vergonha. Vou dizer o quê?

- Diga que estava bêbada. Use o direito de desistência do código de defesa do consumidor. Você é advogada. Dá o seu jeito.

- De jeito nenhum. Liga você e cancela.

- Tá bom.

Desligou. Fiquei me contorcendo de constrangimento. O raio do brinco era realmente medonho e custou R$ 8 mil. Será que paguei à vista?

Quinze minutos depois, o maridão me ligou de volta.

- Cancelei a compra.

- Você é o máximo. O que eles disseram?

- Disseram que você sofreria a penalidade de ser eliminada do sistema deles e jamais poderia fazer outra compra naquela loja. Aproveitei e pedi para que eles fichassem o seu nome em todos os concorrentes.

- Amooor, poxa.

QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?
Amiguinho, a coleguinha Clotilde nos ensina uma valiosa lição sobre os efeitos da cachaça no senso crítico do ser humano enquanto gente. Nossa heroína foi acometida por uma vertente muito comum da bebedeira: a riqueza etílica. Sim, certas pessoas ficam riquíssimas quando bebem. Nesse caso, a melhor forma de prevenção é afastar bolsas e carteiras da pessoa de porre. Amiguinho, chá de cidreira ou camomila ajuda a relaxar durante a noite. Até a próxima!!!




Nenhum comentário: