Há muito tempo, eu li textos do Vinicius de Moraes sobre alguns festivais de cinema da Europa. Foi muito interessante conferir um dos maiores (e mais mulherengos) poetas brasileiros na pele de um mero repórter de caderno de cultura. Pois eu também tive meu momento de Vinicius de Moraes. Não como poeta, evidente, mas como olhos e ouvidos do Portal Terra no Festival do Rio 2004.
Não sou deslumbrado com esses famosos. Vai ser moleza!Bom, não era Cannes, mas o Rio também quis mostrar glamour. A noite de estréia estava movimentadíssima. Tinha tapete vermelho, cinema Odeon lotado, tietes, jornalista buscando aquele depoimento exclusivo e uma cacetada de fotógrafos querendo registrar a calcinha de alguma famosa. Logo na primeira hora, senti que eu teria problemas. Não acompanho novelas, evito TV no domingo, só leio
Caras em sala de espera de médico e nem sei se a
Contigo ainda existe. Então, quem eram aquelas pessoas no tapete vermelho?

- Rapaz, descola algumas fofocas sobre os
famosetes! - era a orientação da minha editora, gente boníssima, por sinal.
Peraí, e o cinema? E os filmes maneiros? Os diretores gringos que iriam dar as caras no Rio? Vou burlar a regra.E seguia a questão:
Quem eram aquelas pessoas no tapete vermelho?No perrengue, defini uma estratégia para descobrir quem é quem: colei no meu fotógrafo, que conhecia Deus e o mundo.
- Quem é aquele ali que está sendo cercado pelos repórteres? - perguntei sem qualquer vergonha.
- É o cara do “Acorrentados” - respondeu de
bate-e-pronto.
- Isso é um filme?
- Não, é um quadro do programa do Luciano Huck.
- Na boa, não vou entrevistar um participante de um quadro do Luciano Huck. Quem é o próximo?
- Tem ali a ex-namorada do Rodrigo Santoro.
- Tá de sacanagem? Vou colocar nos créditos “ex-namorada do Rodrigo Santoro”? Pula essa.
- Olha o próprio Santoro chegando! - avisou e correu. Parecia um arrastão de fotógrafos, cinegrafistas, repórteres, parasitas, alpinistas sociais, papagaios de pirata etc etc.
Pergunta se consegui falar com o sujeito? É ruim, hein!
De repente, o Antonio Fagundes apareceu. Ouvi falar que ele é um nojo. Fui lá conferir. Simpatizei com o malandro logo de cara. Todo mundo embecado e ele usava jeans, tênis e uma camisa xexelenta. E olha que era o lançamento nacional do filme dele, “A Dona da História”. Conversou comigo na maior boa vontade. Dali para frente, eu não deixo ninguém falar mal do Fagundes na minha frente.
Em um cantinho do Odeon, identifiquei um rosto conhecido.
- Fernanda, posso ter uma palavrinha com você? - que Fernanda? Que Fernanda? Ora,
FERNANDA LIMA, belíssima na telinha e mais ainda ao vivo. Usava um decote monumental e aquele sotaque era de enlouquecer....
- Claro - sensacional! Além de deslumbrante, era atenciosa.
Controle! Respira e inspira. Respira e inspira. Nada de babar.
Fiz lá umas perguntinhas básicas sobre o Festival, projetos futuros, blábláblá. O que me interessava era o decote.
- Você é linda - falei na maior cara-de-jacarandá. Quando eu teria a oportunidade de dizer isso para a própria Fernanda Lima?
- Obrigada - sorriu com cortesia. Sei lá quantas vezes por dia essa menina deve ouvir esse gracejo.
Não olha! Não olha! NÃO OLHA!Era trabalho, mas era diversão. Olhei para o decote, sim. Ela percebeu e nem esquentou.
Não é que esse negócio de repórter de cinema é divertido. Melhor que meus tempos de repórter musical. 
E lá fomos, eu e o fotógrafo, para o próximo
famosete.
Essa busca por gente conhecida me rendeu dois momentos dignos de nota. Vamos ao primeiro.
Depois de um tempinho, eu me vendi ao sistema. Nos dias seguintes, conversei com ex-BBBs, capas da Playboy, atrizes-modelos de “Malhação” e uma bateria de gente que nunca vi mais gorda. Em compensação, bati papos ótimos com o Hugo Carvana, Domigos de Oliveira (quando entendia o que ele dizia), José Wilker, Aílton Graça, Fernando Meirelles, Patrícia Pillar e Wagner Moura (com sotaque arretado), entre outras figuras legais.
A melhor de todas foi a Marieta Severo, ainda na noite de abertura do Festival. Depois da projeção de “A Dona da História”, driblei os jornalistas de
Rede TV! fui arriscar uma entrevista com ela.
- Parabéns pelo filme, Marieta - comecei.
- Obrigada, você gostou?
Caramba, uma das atrizes mais respeitadas e talentosas da cultura brasileira perguntou se eu, um moleque de 26 anos, gostei do filme dela. E perguntou com interesse, sem fazer média. Putz, achei fraquinho o raio do filme, mas eu não poderia dizer isso. Também não mentiria. E agora?
- Você está maravilhosa em todos os momentos.
Ela sorriu e me deu uma baita entrevista, dentro das condições que tínhamos.
O segundo momento foi em um fim de noite após dois filmes seguidos e várias entrevistas.
- Editora, é quase meia-noite. Fechou minha cota do dia?
- Ah, Douglas, ainda não. Queria que você desse um pulinho lá na estréia do filme do Metallica. A sessão começa na madrugada. Vê se tem algum roqueiro famoso lá.
Ai, ai, ai...E lá fomos nós, o fotógrafo e eu, para Botafogo em busca de cabeludos da mídia.
Chegamos e

o saguão do cinema estava vazio. O filme já tinha começado. Perguntei ao bilheteiro se algum
rockstar havia dado as caras.
- Nenhum. Outros repórteres já foram embora.
E agora?
Nesse instante, vejo na calçada três transeuntes de preto e jeitão de fãs do Metallica. Olha que preconceito o meu. Só por estarem vestindo roupas negras, eles tinha cara de metaleiros. Eu gosto de rock pesado e não me visto como uma viúva recente. Pensamento antiquado!
Bom, hora de improvisar.- Ô, vocês aí! - expliquei a situaçao e pedi para posarem ao lado do pôster da banda. Eles relutaram um pouco, mas usei o argumento de que eles teriam destaque no Portal Terra. Acendi o ego do trio e eles acabaram topando. Todo mundo quer ter seu pedacinho na pizza da fama.
No dia seguinte, o Terra publicou: "fãs comparecem ao lançamento do filme do Metallica".
- Doug, como está o trabalho? - me telefonou a editora lá de Sampa.
- Coisa de cinema, chefa. Coisa de cinema.
E só pra constar: não consegui registrar nenhuma fofoca ou babado das celebridades. Desculpa, editora. Foi de propósito.
PS. Para quem quiser conferir as resenhas de cinema do Vinicius, clique aqui.
***
QUAL A MORAL DA HISTÓRIA,
HE-MAN?
Vamos começar filosofando: muito antigamente, as meninas queriam ficar bonitas para desfilar na praia de Ipanema e, quiçá, ser comparadas ou vistas perto da Leila Diniz. Hoje, o barato é ser “artista de novela”. Aí, amiguinho, é uma erupção de famosos instantâneos, marombados, siliconadas e embarrigadas. Parece que eles se multiplicam na água. Isso é bom para sustentar o emprego do Décio Piccinini, Leão Lobo, Sônia Abrão e outros, mas enchem um pouco o saco. Amiguinho, quando magoar um coleguinha, seja humilde e peça desculpas.